Cada vez mais os alimentos ultraprocessados, ou de baixo valor nutricional, ganham espaço na alimentação da população. Segundo a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), promovida pelo Ministério da Saúde, no ano passado, 78,6% dos adultos residentes nas capitais do país não consumiram a quantidade mínima de frutas, verduras e legumes recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de 400g por dia, por pessoa.
A pesquisa coletou dados de seis cidades brasileiras: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belém, Curitiba e Recife.
Os dados, incluindo os números calculados pela última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), de 2019, indicam que entre 63% e 68% da população residente nas 27 capitais brasileiras não consome esses alimentos regularmente, ou seja, em cinco ou mais dias na semana. A situação mais crítica é a de Belém, no Pará, onde apenas 18,1% da população consome regularmente frutas e verduras.
Uma alimentação desequilibrada pode levar a doenças cardiovasculares que, dependendo da quantidade consumida, podem evoluir para doenças mais graves, como infarto, acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência cardíaca e doença arterial periférica. Como explica a especialista em cardiologia Nathalia Chrispim, esses alimentos aumentam os riscos cardiovasculares porque são ricos em lipídios ruins.
O principal lipídio associado a essas doenças é o colesterol LDL, responsável pela formação da doença aterosclerótica, considerada precursora das doenças cardiovasculares. “A recomendação é reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados, ou seja, utilizá-los com moderação. O objetivo geral de uma alimentação saudável é melhorar a saúde dos pacientes e reduzir o risco de doenças”, alerta o médico.
O especialista destaca ainda que fatores socioeconômicos podem contribuir para a má alimentação, o que inclui insegurança alimentar ou falta de disponibilidade, falta de tempo e alimentação fora de casa, ou alimentos pré-preparados. “Uma dieta saudável também pode ajudar no controle do peso e está associada à melhoria da qualidade de vida relacionada à saúde e à redução do risco de fragilidade em idosos”, acrescenta.
Qualidade de vida é o que a advogada Mariana Monique, 35 anos, moradora do Gama, vivencia após reduzir drasticamente o consumo de alimentos ricos em gorduras e carboidratos. “Meu sono está melhor, parei de roncar, meu humor também melhorou. Para mim foi muito difícil acordar cedo e ir trabalhar. A dor passou, não sinto mais dor. A saúde é outra”, diz ela.
Mariana pesava 125 kg quando percebeu que precisava mudar sua rotina alimentar. “Ela tinha pressão alta, a noite de sono era péssima, sentia muitas dores no corpo, principalmente no quadril”, revela. Acima do peso ideal desde criança, ela decidiu embarcar em uma rotina diferente para aumentar sua saúde física e, consequentemente, mental — e os resultados foram positivos.
“Minha alimentação consiste em reduzir carboidratos, aumentar o consumo de proteínas e fibras. Muita água, pelo menos 2,5 litros por dia. Zero açúcar no dia a dia. Eventualmente, num fim de semana me permito comer algo mais calórico. Zero refrigerante, zero álcool”, afirma o advogado.
Bem-estar
Uma boa alimentação e atividade física são sempre bons aliados na hora de cuidar da saúde do corpo. Mesmo assim, a rotina e a correria do dia a dia podem impedir uma disciplina mais consciente em relação ao que comer e quando. Diante disso, a nutricionista clínica Dania Sánchez listou cinco estratégias para quem tem pouco tempo ao longo do dia e busca uma alimentação mais saudável.
A primeira dica é para quem frequenta lanchonetes regularmente. Para isso, a nutricionista recomenda preferência por sanduíches com carnes magras e grelhadas, evitando frituras e empanados. “Opte por molhos para salada com baixo teor de gordura. Se for comer pizza, opte pelas opções simples com queijo e tomate ou opções vegetarianas”, ressalta.
A segunda é manter a preferência por frutas, sucos naturais, salada de frutas, água de coco ou barras de cereais naturais, em vez de salgadinhos. Variedade e equilíbrio durante o dia também são recomendados. “Evite repetir refeições e deixe a sobremesa para os dias de prática de atividade física. Seguir o princípio ‘coma comida de verdade’ do Guia Alimentar para a População Brasileira é fundamental.”
Além disso, a nutricionista recomenda alimentos ricos em nutrientes, que ofereçam grande quantidade em pequenas porções. Ainda é interessante utilizar recursos para se informar, como podcasts e sites, que complementam informações sobre uma boa rotina saudável.
“Portanto, é crucial sensibilizar a população sobre os riscos para a saúde e o ambiente associados ao consumo excessivo de alimentos ultraprocessados e promover uma dieta baseada em alimentos frescos, minimamente processados e de origem sustentável”, recomenda Dania Sánchez.
Produção local
Para superar os desafios socioeconômicos e logísticos que ainda impedem a difusão de alimentos saudáveis a custos mais acessíveis para a população, uma das alternativas é incentivar a produção nas cidades e arredores. Com essa visão, o Instituto Escolhas elaborou um relatório, que destaca as vantagens desse tipo de produção para o fortalecimento de práticas de bem-estar.
Segundo o levantamento, com o incentivo e a expansão da produção de alimentos na região metropolitana de São Paulo, por exemplo, até 20 milhões de pessoas seriam abastecidas com hortaliças todos os anos. Além disso, em Belém, a produção de 19,4 mil toneladas de hortaliças e mandioca, em 344 hectares de espaço ocioso, poderia abastecer 1,7 milhão de pessoas por ano, número superior a toda a população da capital paraense, atualmente em torno de 1,5 milhão.
A pesquisadora e gerente de portfólio do Instituto Escolhas, Jaqueline Ferreira, explica que, quando os alimentos são produzidos em locais mais próximos dos consumidores — presentes, em sua maioria absoluta, nas grandes cidades —, há uma potencial redução nos custos de transporte e comercialização, o que é refletido no preço final.
“É bom que a agricultura esteja próxima, porque aproveita toda a rede de infraestrutura de uma cidade, mas também barateia os preços, no sentido de reduzir custos de logística e distribuição, e também conecta mais facilmente produtores e consumidores”, analisa o pesquisador.
Ela ressalta, porém, que não basta apenas promover a produção. A prioridade é levar a comida à mesa do consumidor. Para tal, a investigadora destaca a importância de identificar e promover a produção alimentar em territórios que têm menor oferta e disponibilidade de alimentos frescos e saudáveis a preços acessíveis, para a população que tem mais dificuldades no acesso aos mesmos.
“Se você for a qualquer capital, por exemplo, em São Paulo, no centro da cidade há uma variedade enorme de estabelecimentos que vendem produtos frescos e saudáveis, mas se você, de repente, for para áreas mais periféricas, não encontrará mais , e isso é uma realidade em diversas cidades brasileiras”, comenta Ferreira.
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