Colocar Solange de Campos César*, Nara Rúbia Mendes Santos** e Carlos Eduardo Machado Feitoza*** – O Código Civil Brasileiro, em vigor desde 2002, foi criado antes da popularização da internet e do surgimento do marketing de influenciadores em seu formato atual. Como resultado, não aborda diretamente as relações entre influenciadores digitais e seus seguidores. Nos últimos anos, leis como o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) têm sido debatidas e adaptadas para melhor regular o ambiente digital, mas o Código Civil também começa a passar por importantes revisões para se adaptar a estas novas realidades.
Em 2023, foi criada uma Comissão de Juristas com o objetivo de rever o Código Civil, propondo alterações que impactem diretamente a vida dos cidadãos, especialmente no que diz respeito ao direito digital. A minuta, elaborada pelos juristas Flávio Tartuce e Rosa Maria de Andrade Nery, iniciou sua tramitação no Senado Federal em abril deste ano. Após aprovação no Senado, o projeto seguirá para a Câmara dos Deputados. Entre as principais alterações propostas destaca-se a inclusão, pela primeira vez, de um livro específico dedicado ao Direito Digital. O objetivo é trazer maior clareza e segurança jurídica tanto aos influenciadores digitais quanto aos internautas, adequando a legislação às demandas impostas pelos avanços tecnológicos.
Entre as discussões suscitadas pela revisão do Código Civil e demais leis correlatas estão algumas mudanças significativas. Uma delas é a exigência de maior transparência nas publicidades realizadas pelos influenciadores. As novas regras propõem que esses profissionais deixem claro quando uma publicação é paga, reforçando a confiança entre eles e seus seguidores.
Além disso, o texto sugere responsabilizar os influenciadores por informações falsas ou enganosas divulgadas em seu conteúdo. Isso inclui também a responsabilidade solidária das plataformas digitais, que teriam maior controle sobre o que é publicado. Estas medidas visam combater a desinformação, mas também levantam questões sobre a liberdade de expressão e os limites exatos desta responsabilidade.
Outro ponto importante em debate é a atualização das regras de direitos autorais no ambiente digital. Com a utilização constante de músicas, imagens e outros conteúdos protegidos, a legislação procura encontrar um equilíbrio entre a proteção dos criadores e a liberdade criativa dos influenciadores digitais. O texto propõe que, embora garantam a proteção aos autores, não sejam impostas barreiras tão rígidas que inibam a inovação e a criatividade nas redes sociais.
A proteção de dados e a privacidade também estão no centro das discussões. Os influenciadores digitais, que lidam diretamente com os dados de seus seguidores, devem seguir rigorosamente a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). O uso correto e ético dessas informações será essencial para garantir que os direitos de privacidade sejam preservados no ambiente virtual. Além disso, a proposta inclui a remoção de conteúdos sensíveis, como imagens íntimas, pornografia falsa e materiais envolvendo crianças e adolescentes, garantindo maior proteção aos direitos individuais no ambiente digital.
Outro ponto que poderá transformar o mercado de influenciadores digitais é a proposta de regulamentação da profissão. Sugere-se a criação de um cadastro profissional para influenciadores, bem como de um conselho de ética para monitorar suas práticas e definir padrões de conduta. No entanto, é fundamental que esta regulamentação seja equilibrada, para não criar barreiras excessivas à entrada no mercado.
Por fim, o projeto também aborda o reconhecimento do patrimônio digital, estabelecendo regras para ativos digitais como perfis em redes sociais, criptomoedas e contas de jogos, que podem ser herdados ou descritos em testamentos. A regulamentação destes bens traz uma abordagem inovadora à lei, mas a sua implementação exigirá clareza na definição de direitos e responsabilidades.
As áreas que requerem maior atenção na atualização do Código Civil são aquelas relacionadas à privacidade, segurança cibernética, direitos autorais e impacto da inteligência artificial. O maior desafio será garantir que a legislação não se torne rapidamente obsoleta face à constante evolução tecnológica. A legislação precisa de ser adaptável, acompanhando estas mudanças, garantindo ao mesmo tempo a proteção dos utilizadores e promovendo a inovação, sem abrir mão da liberdade de expressão.
Embora ainda em desenvolvimento, esta atualização do Código Civil tem potencial para transformar o ambiente digital brasileiro, promovendo um relacionamento mais transparente, ético e seguro entre influenciadores, plataformas digitais e usuários. A legislação digital está em expansão e novas leis e diretrizes podem surgir a qualquer momento. Até lá, os tribunais continuarão a interpretar as normas em vigor, servindo de guia para a aplicação das normas neste contexto inovador.
*Presidente da Comissão de Direito Condomínio da Subseção OAB-DF Taguatinga
**Secretário da Comissão de Direito Condomínio da OAB-DF Subseção Taguatinga
***Presidente da Comissão de Direito Digital da OAB-DF Subseção Taguatinga
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