Um dia depois de virem à tona denúncias de assédio sexual — que incluíam até a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco —, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu ontem o advogado Silvio Almeida, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. O anúncio foi feito após encontro entre eles, no Palácio do Planalto, classificado pelos auxiliares como tenso. Na reunião, segundo interlocutores ouvidos pelo CorrespondênciaAlmeida afirmou que não pediria para deixar o cargo e deixou a Lula a tarefa de demiti-lo.
A ministra Esther Dweck, de Gestão e Inovação em Serviços Públicos, chefiará interinamente a pasta de Direitos Humanos e Cidadania. O Palácio do Planalto pretende definir a substituição de Silvio Almeida até a próxima semana.
A situação do ex-ministro piorou em muito pouco tempo. Apesar de ter publicado uma nota e um vídeo nas redes sociais na noite de quinta-feira, logo após a divulgação das denúncias da organização MeToo Brasil — focada no atendimento a mulheres vítimas de violência sexual —, dentro do governo já havia a convicção de que as horas de Silvio estavam contadas . Isso porque, já há algum tempo, circulam na Esplanada dos Ministérios comentários sobre a conduta do ex-ministro com colegas de trabalho.
Três indicativos
O futuro de Silvio Almeida parecia estar selado ontem de manhã. Três fatos que indicaram isso chamaram a atenção dos observadores políticos: no primeiro, em comunicado, o Ministério da Mulher classificou como “graves” as denúncias contra ele e manifestou solidariedade a todas as mulheres “que diariamente quebram o silêncio e denunciam situações de assédio e violência”; na segunda, a primeira-dama Janja Lula da Silva publicou em uma rede social uma foto, sem legenda, em que beijava a testa de Anielle; e, na terceira, em entrevista à Rádio Difusora, de Goiânia, Lula enfatizou que “não posso permitir assédio (no governo)”.
“Então é o seguinte: teremos que descobrir isso corretamente. Mas acho que a continuidade no governo não é possível, porque o governo não fará justiça ao seu discurso, à defesa da mulher, à defesa, inclusive, dos direitos humanos, com alguém que está sendo acusado de assédio”, finalizou o presidente.
Como defesa, o ex-ministro afirmou que as denúncias nada mais eram do que uma tentativa de manchar sua reputação e a trajetória construída na lei, especialmente na proteção às minorias. Ele também acusou setores da política de quererem seu cargo e que recorreria à Procuradoria-Geral da República (PGR) e à Procuradoria-Geral da República (AGU) para entrar no caso e investigar as acusações que enfrenta. Também contratou um escritório de advocacia para processar por acusações caluniosas todos aqueles que, eventualmente, não comprovassem as acusações feitas contra ele.
O ex-ministro também confrontou o MeToo Brasil. Por meio de uma segunda nota, publicada na manhã de ontem, ele a acusou de tentar interferir em licitações do ministério e expôs nomes de advogadas da entidade e de mulheres que atuavam em áreas de gestão do departamento que comandava. No Palácio do Planalto, tais reações foram interpretadas como ataques para desqualificar os acusadores —os aliados de Lula viram o ato como uma exposição indevida do povo, cujos nomes foram divulgados.
Em outra frente de contra-ataque, os auxiliares de Silvio Almeida passaram o dia mobilizando apoios ao ex-ministro. O Correio apurou que um formulário de apoio foi distribuído em grupos de WhatsApp vinculados à secretaria, após a divulgação das denúncias. Ex-funcionários do ministério, porém, relataram que a prática de assédio moral era “comum”.
Silvio Almeida foi chamado, há semanas, pelo ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Marques, para falar sobre as acusações de assédio sexual. Ele alegou inocência, disse que sabia das acusações há sete meses e foi incentivado a renunciar —possibilidade que o então Ministro dos Direitos Humanos rejeitou. Interlocutores do presidente garantem que Lula foi informado das acusações dias atrás e reagiu com raiva.
A tarde foi repleta de reuniões no Planalto. Assim que voltou de Goiânia, o presidente se reuniu com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski; com AGU, Jorge Messias; e com o ministro da CGU. Os três conversaram com Anielle, que lhes confirmou o assédio. Ao chegar para se encontrar com Lula, Silvio Almeida foi demitido —basta ser avisado.
Silêncio
A “eloquência” do silêncio de Anielle em relação às acusações de assédio sexual contra Silvio Almeida chamou a atenção desde o primeiro momento. Interlocutores do governo que ouviram rumores sobre a conduta do ex-ministro tiveram a certeza de que as alegações tinham fundamentos sólidos.
Com a publicação da foto beijando a testa de Anielle, da primeira-dama Janja Lula da Silva, ficou claro que a demissão de Silvio Almeida era questão de (pouco) tempo. Deputados e membros do Executivo passaram a publicar mensagens e fotos de apoio ao ministro.
Anielle, porém, permaneceu em silêncio, apenas rompido quando a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República emitiu comunicado com a demissão de Silvio Almeida. Também em nota, ela agradeceu a atitude de Lula e afirmou que episódios de assédio sexual não são aceitáveis.
“Não é aceitável relativizar ou diminuir episódios de violência. Reconhecer a seriedade desta prática e agir imediatamente é o procedimento correto. Por isso, destaco a atuação contundente do Presidente Lula e agradeço todas as manifestações de apoio e solidariedade que recebi. As tentativas de culpar, desqualificar, constranger ou pressionar as vítimas a falar em momentos de dor e vulnerabilidade também são inadequadas, pois apenas alimentam o ciclo de violência. Peço que respeitem meu espaço e meu direito à privacidade. Contribuirei com as investigações, sempre que for convocado”, disse Anielle.
Para piorar a situação de Silvio Almeida, a candidata a vereadora em Santo André (SP) pelo PSB, professora Isabel Rodrigues, postou nas redes sociais um vídeo acusando Silvio Almeida de tê-la tocado com intenções sexuais. Ela disse que eles eram amigos e mantinham um bom relacionamento até o episódio, que teria acontecido em agosto de 2019.
“Ele estava do lado direito e eu do esquerdo. Eu estava de saia, ele levantou minha saia e colocou as mãos nas minhas partes íntimas. Fiquei chocado, tive vergonha das pessoas, porque é assim que as vítimas se sentem, as vítimas têm vergonha e esse caso teve muitas reviravoltas na minha vida. Demorei para entender que estava sendo vítima de violência sexual”, conta Isabel, no vídeo.
As investigações, porém, não terminam com a demissão de Silvio Almeida do governo. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, instruiu a Polícia Federal (PF) a investigar o episódio —a corporação nomeou um delegado para dirigir as investigações. A Comissão de Ética Pública também coletará dados sobre as denúncias.
Ação rápida
A renúncia de Silvio Almeida marca o governo Lula, assim como o do economista Pedro Guimarães, e é um dos pontos baixos da gestão de Jair Bolsonaro. No entanto, a favor dos dois presidentes está a ação rápida para destituí-los do primeiro nível de governo.
A denúncia contra Guimarães veio à tona em 28 de junho de 2022. Vinte horas depois, ele deixou o comando da Caixa Econômica Federal, que presidiu entre janeiro de 2019 e junho de 2022.
A primeira denúncia contra Guimarães chegou ao Ministério Público Federal, de forma anônima, em maio de 2022. Foi quando o Ministério Público começou a convocar possíveis vítimas e testemunhas para depor.
O relato de uma das mulheres assediadas diz que Guimarães, em viagem de trabalho, pediu que ela fizessem sauna juntas. Diante da recusa, o então presidente da Caixa a convidou novamente, mas para um mergulho na piscina. A mesma funcionária também relatou que em uma confraternização colocou a mão no bolso de trás da calça dela —e ainda fez um comentário machista.
Uma segunda funcionária afirmou que Guimarães pediu beijos e a abraçou forte. Uma terceira disse que foi apalpada por ele depois do jantar, também em viagem de trabalho. No dia 31 de março, o ex-presidente da Caixa tornou-se réu por assédio sexual e moral após a Justiça Federal de Brasília aceitar denúncia do MPF. A ação ocorre em sigilo. (Ingrid Soares, Julia Portela, Fabio Grecchi e Victor Correia colaboraram)
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